Thursday, January 01, 2009

O presságio do adágio




A melodia ainda permeava suavemente em seus ouvidos. Cada nota glissada entre sinais de pausa e de pianíssimo. Cada gesto apreendido na mágica dos acordes matinais que por ali tocava. Em três vozes harmonicamente adornadas com terças e quintas. E quem sabe, aos sábados também. Seguindo o canto...

Quase duas



O efeito do vinho passara e, uma vez mais, Charles sentia repulsa pelos atos da noite passada. Cada palavra excessiva, cada gesto em hipérbole. Talvez, na realidade, se orgulhasse de seus feitos. Internamente gargalhava e rememorava cada instante de insanidade etílica. Já eram nove e quinze da manhã. Levantou e, após calçar-se, foi para o trabalho.

Thursday, December 25, 2008

Uma vez mais, Samir despertara de um sonho que não conseguia lembrar-se exatamente do que se tratava. Adorava sonhar que viajava o mundo em um balão laranja e arremessava frases de suas poesias desconexas para que as pessoas pudessem respirar suas palavras antes de ler. Somente ele compreendia de fato tal propósito, mas era no mínimo interessante.

Agora, achava que tinha sonhado com algo relacionado a uma melodia fantabulosamente linda e dourada e olfatos em êxtase e tudo o mais de lírico que possa haver em um por do sol naqueles olhos apaixonados que encontrara de soslaio.

Relutara.

Cedera.


Sim, talvez fosse um sonho.


O despertador novamente cortava o silêncio do início daquela manhã chuvosa de terça feira soprando sete e quinze e já estava atrasado meia hora para o trabalho.

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Saturday, November 08, 2008

Dolmens digitais


Chovia. Acordei com o som de seu isqueiro e seus passos no corredor. Passos macios como de costume. Aliás, ela era toda macia. Toda. Ainda lembro da tarde plúmbea no Café do Francês. Ela no balcão sorvendo suavemente seu chá predileto e pedindo uma música de Coltrane. Porra, John Coltrane! Essa mina é foda, pensei. Rabiscava vorazmente e com uma expressão de êxtase a cada palavra escrita. Poemas, soube depois. Dizia-me que eu deveria escrever também. Certa vez na faculdade em que ela cursava, enquanto esperávamos o bendito ônibus, declamou um texto de Bandeira Tribuzzi em cima de uma planta que recostava-se preguiçosamente por ali. Eu sorri. Que mais poderia fazer diante de todo aquele potencial artístico. Metafísico. Erótico-passional. Sei lá.
Um dia, fui convidá-la para assistirmos à apresentação da banda de um amigo em comum. Um som estratosférico-progressivo-lisérgico, como o próprio guitarrista o definia. Liguei. A mensagem tentava consolar-me de que ela já estava longe, fora do alcance dos raios da telefonia moderna. Insisti. Redisquei. Em vão. Não desperdicei o convite e fui cabisbaixo assistir ao show. Algumas cervejas depois recitei mentalmente, ao som de uma triste canção, um dos versos mais foda que ela escreveu. Chamava-se Dolmens Digitais:

“Corto meus pulsos
com barbeadores elétricos
e mergulho nas águas gélidas
do meu copo
teu corpo me vem em mente
e, acredite,
não conto duas vezes a mesma mentira
então,
tira-me daqui.”

Também pedi para tirarem-me de lá. Mas tive que sair por minha própria conta e após incontáveis quedas cheguei em casa. Exausto, ébrio e com uma puta saudade de algumas horas sem vê-la.
Horas essas que se arrastam até o momento em que acordo ouvindo o acender de um cigarro que eu julgava ser dela. Passos que eu também julgava ser dela. Levanto sem calçar meus chinelos. Afoito, temeroso. Corro até a porta e ao abri-la deparo-me, na parte de baixo da escada, com móveis e caixas de mudança. Objetos embalados em plástico-bolha e jornal. Pude visualizar bem uma reprodução de um quadro de Tarsila. Anjos. Angelicalmente, o apartamento ao lado será ocupado por uma linda vizinha que, com os cabelos molhados da chuva lá fora, acende outro cigarro e gentilmente me oferece um também em troca de minha ajuda. Aceito. Que mais posso fazer diante de tamanho apelo nicotínico. Matinal. Pictórico-onírico. Sei lá.

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Friday, November 02, 2007

EM FREQUÊNCIA MODULADA

Sintonizo o Universo
Amplifico seu reverso
Ouço tudo dito em Verso
Mas eu digo tudo inverso

Sinto isso e reinvento
Harmonizo, sopro ao vento
Sendo este meu intento
Vou seguindo o rio, lento

Ao certo, não sei
Se sou rei ou se serei
dos jardins das ilusões
ouço o Som dos teus bordões

Saturday, October 13, 2007

SOTURNO

Um dia o rei glutão
Quis pensar sobre o Amor
Viu venturas, solidão
Achou melhor o dissabor

E nem a aurora boreal
Sabe ao certo responder
Se o seu choro real
Realmente é de sofrer

Mas se a tal chuva escarlate
Sim, a mesma em que chorei
For agora um disparate
Desculpe, eu também me enganei

12:21

Tempo louco
Bicho solto
Um pouco muito ou muito pouco
Lento, lento ou mar revolto

E eu?
Vôo ou volto?

DELÍRIO COTIDIANO

Na lua te encontro sozinha a bailar
Teu corpo tal qual labareda no ar
O teu penteado serpenteando
Moldando teu rosto, me açoitando

Não faz assim...

No fim do festim me atiro em teus braços
Unindo os beijos em etéreos laços
Contudo, a aurora vem galopando
Te levando embora, tu foste dançando

Não faz assim...

Saturday, August 18, 2007

TEU DRINK EM MEU TERNO


Eu sei lá se sei
Selar-te, pensei
Ou imaginei

Será quem ti viu
Soslaio, sentiu
Ou não se iludiu

A partir de mim
Solstício sem fim
Só diga que sim

MANIFESTO FRILE-SE


Frile-se
Livre-se
Vire-se
Desvire-se
Em desvario (ins)pire-se
Em desafio
Em desatino
Se desafino
Quase esqueço
Se é pauta ou fio
Soneto tão frio
E em cinza amanheço

NEBULOSIDADE VARIÁVEL


Se você
diz que não me vê
moça, ouça-me


sem querer

fiz você fazer

força


Mil saberes
dizem:

Flua!

Míopes seres
pela
rua

CRONOFASIA


O esquilo esquálido
Disse-me ao dia
Que o vento cálido
Não mais viria

Esquivo pálido
Ao meio dia
Meu tempo válido
O canto anuncia

Tempo vai
Tempo vem

Sinto compassos
E a melodia
Toco em teus braços
Pauta vazia

Cem lentos passos
Pura apatia
Desato laços
Cronofasia

Tanto faz
Tanto fez


CANTILENA


Cantilena,
Minha pequena

Cante,

sempre vale a pena

ande
l e n t o ,
b e m l e n t a m e n t e

em melodias
de repente

Saturday, August 04, 2007

}}Vôo}}

Salto

Em altos e baixos
Embaixo de saltos

Em solo citrino

Na sola
Da coca
Da cola
Que assola
Sem nada

Meu mundo

$em mola

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